IAC e Unicamp desenvolvem farinha de folha de mandioca biofortificada com 50 vezes mais ferro vegetal
Como absorver 18 miligramas de ferro, que é a necessidade diária do corpo humano? Basta consumir cerca de 2,5 colheres (16 gramas) de sopa de farinha de folha de mandioca rica em ferro vegetal. Mas não é qualquer farinha! É a biofortificada resultante de pesquisa conduzida pela pesquisadora do Instituto Agronômico (IAC-APTA), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Juliana Rolim Salomé Teramoto, em parceria com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde a cientista fez seu doutorado. O ganho proporcionado pelo estudo é tão relevante que para o organismo absorver esse teor de ferro diariamente, seria necessário comer um quilo de feijão também biofortificado! Ou seis quilos de uma farinha de folha de mandioca não enriquecida. Como esses volumes são inviáveis para o ser humano, a pesquisadora do IAC desenvolveu uma tecnologia capaz de enriquecer a farinha de folha de mandioca, que pode ser usada para consumo humano e animal. O processo gerou um depósito de patente. As variedades de mandioca usadas no estudo foram a IAC 576 e a IAC 6-01.
“Aumentei em torno de 50 vezes o teor de ferro e ampliei a bioacessibilidade de minerais como ferro, zinco e molibdênio, aumentei também o teor de proteína e sua digestibilidade e de aminoácidos essenciais”, resume Juliana.
A pesquisa obteve também a redução dos fatores antinutricionais: substâncias que reduzem ou impedem a utilização de um elemento nutritivo e, no caso, dificultam a absorção do ferro disponível nos alimentos. “Consegui diminuir a toxicidade em torno de 93% e os fatores antinutricionais também, por exemplo, reduzi em cinco vezes o teor de taninos, 60% fenóis totais e 10% ácido fítico, que de alguma forma interferem na absorção de minerais pelo organismo. O resultado final é que potencializamos a absorção do ferro”, resume.
No mundo, a deficiência de ferro e anemia por deficiência de ferro atinge mais de 25% da população mundial. A falta de ferro prejudica o desenvolvimento cognitivo, físico e intelectual, causa fadiga e reduz a produtividade nos seres humanos. De olho nessa necessidade da população, a pesquisadora traçou seu estudo de modo a gerar resultado que contribuísse para saúde das pessoas em geral, em especial para aquelas que não consomem carne vermelha, maior fonte de ferro, ou o fazem em menor quantidade por restrições econômicas ou por opção de dieta. O aumento do teor de proteína é ótimo para o vegano e para o vegetariano, que encontra nesta farinha biofortificada um alimento com maior teor proteico. “Na alimentação vegana, que não consta ferro de origem animal, há deficiência desse nutriente”, diz Juliana.
A pesquisadora traçou um plano de pesquisa com o objetivo de criar um sistema em que pudesse potencializar numa planta a quantidade de ferro. “Criei um processo, com folha mandioca porque a cultura é nativa do Brasil, super adaptável às condições de clima e de solo”, diz. Segundo Juliana, a folha de mandioca é pouco aproveitada no Brasil. Do ponto de vista nutricional é muito rica, mas tem fatores antinutricionais, assim como a raiz, que precisa ser trabalhada para esses fatores não serem prejudiciais.
“Além de a fome mundial ser um problema, nutrir a população também é um desafio para contribuir com saúde humana. E contribuir para que as pessoas não apenas comam, mas comam melhor, de modo a suprir a necessidade nutricional do organismo”, comenta.
No estudo, Juliana planejou o uso da farinha de folha fortificada de mandioca para ser consumida como opção do cardápio humano diário e também para ser usada para suplementar a ração de aves e, desta forma, biofortificar a carne avícola, que tem preço mais acessível à população. “Fiz o teste suplementando as rações de codorna para ver o aconteceria na carne e ovos.
Três objetivos foram alcançados
A pesquisadora do IAC conseguiu atingir os três objetivos da pesquisa. Primeiro, o processo adotado fortificou a farinha de folha de mandioca, depois esta farinha de folha de mandioca apresentou valores nutricionais significativos em termos de bioacessibilidade e, em terceiro, comprovou que a carne de codorna apresentou maiores de ferro contribuindo para que a absorção no organismo humano ocorra com sucesso. “Observei que a farinha aumentou em três vezes o nível de ferro na coxa e na sobrecoxa da codorna, em 60% no fígado e, em menor escala, no coração, no peito e no ovo da ave”, descreve. “Essa terceira meta deu super certo”, comemora.
Segundo a cientista, a importância do enriquecimento está no fato de o ser humano poder comer uma menor quantidade do alimento biofortificado e que irá proporcionar a quantidade de ferro necessária para o organismo estar bem nutrido. “Com essa farinha biofortificada, a pessoa pode comer menos carne ou não comer a carne e encontrar na farinha o percentual de ferro necessário ao corpo”, diz a pesquisadora que conduziu a pesquisa durante cinco anos.
Outra possibilidade é usar a farinha enriquecida como ingrediente em algumas linhas alimentares, como na produção de snacks, massas para macarrão e pão, por exemplo.
O que é bioacessbilidade
A pesquisa aumentou a bioacessibilidade de ferro – isto é -, deixou-o em condições de ser melhor absorvido pelo corpo. No ferro, o salto foi de 2 % para 23 %, no zinco a bioacessibilidade aumentou de duas a três vezes e no molibdênio, de quatro a seis vezes. Isso é relevante porque muitas vezes o nutriente está no alimente, mas não em condições de ser aproveitado pelo organismo. A pesquisadora cita o caso de alimentos enriquecidos em processos industrializados, mas que não são totalmente absorvidos.
“Bioacessibilidade é o seguinte: não basta comer um pacote de bolacha, que traz escrito na embalagem “enriquecido com ferro” porque nem sempre esse ferro que a indústria adiciona, o corpo absorve. Quando aumentamos a bioacessibilidade do ferro de 2% para 23%, significa que ao ingerir a farinha, o corpo está absorvendo 23% ao invés de 2%, o mesmo aumento ocorreu para o zinco e o molibdênio”, explica.
Como foi feito o estudo
No estudo foram usadas as folhas de mandioca, quase sempre inutilizadas. Elas foram secas e moídas. O processo eliminou as toxinas presentes, que a impedem de ser consumidas naturalmente. Nos experimentos, tinham folhas de mandioca de variedades IAC que receberam tratamento e as que não receberam o tratamento proposto. A mistura tem substâncias que fazem parte de um segredo industrial já patenteado.
Os próximos passos serão destinados a testes com outros vegetais para ver se esse resultado pode ser positivo para outros produtos.
Na agronomia, há várias possibilidades de fortificar os alimentos, que envolvem: melhoramento genético tradicional, engenharia genética e manejos no campo via solo ou via aérea e também por hidroponia. Mas esses mecanismos enfrentam restrições por conta de tempo, custos ou pelo próprio percentual de fortificação alcançado.
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