cobra_capa

Na próxima quinta-feira (21), o pesquisador e ex-diretor do Laboratório de Ecologia e Evolução do Instituto Butantan, Dr. Otávio Augusto Marques, e o médico e diretor do Hospital Vital Brazil, Carlos Roberto de Medeiros, lançam o livro Nossas Incríveis Serpentes (Ed. Ponto A), que fornece informações básicas sobre cobras e é voltada para médicos, biólogos, professores e estudantes, entre outros interessados no assunto. O evento de lançamento ocorrerá às 19h no próprio Instituto Butantan.

Reconhecido como um dos mais importantes centros de pesquisa biológica do Brasil, o Butantan é responsável por mais de 50% da produção de vacinas e por 46% de soros para uso profilático e curativo no país, além de contar com o Hospital Vital Brazil, referência no atendimento de acidentes causados por animais peçonhentos. O livro reúne informações acumuladas pelos dois pesquisadores ao longo de suas experiências em campo e no dia a dia do instituto, constituindo uma obra essencial para informar e esclarecer especialistas e leigos sobre origem, características, prevenção a acidentes e conservação das espécies, entre outros tópicos.

Para falar sobre esta obra, a Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC) entrevistou o pesquisador Dr. Otávio Augusto Marques, que também é professor credenciado pelo programa de pós-graduação em Biologia Animal da Universidade Estadual Paulista (Unesp), cujo trabalho se situa principalmente na história natural de serpentes.

APqC – No próximo dia 21, em parceria com o Dr. Carlos Medeiros, você lança o livro Nossas Incríveis Serpentes. O que o leitor que se interessa pelo assunto irá encontrar nesta obra?

Dr. Otávio Marques Este é um livro que eu sonhava em escrever desde que entrei no Instituto Butantan, porque há ainda muita desinformação sobre esses animais. Como lidamos principalmente com o público leigo, tive o cuidado de tornar o livro acessível a todos e não apenas aos especialistas. Assim, todo aquele que se interessar pelo assunto irá encontrar informações que vão desde a origem e as características das cobras nativas, passam pela parte médica e culminam na conservação das espécies.

Podemos dizer que o livro é também resultado do acúmulo de informações que você adquiriu ao longo de sua trajetória como pesquisador? Como foi o processo de produção da obra?

Sem dúvida. Tentei ser o mais rigoroso possível nas informações. Como eu disse, há muita informação equivocada sobre as cobras e o livro esclarece alguns pontos. Por exemplo: é comum ouvirmos por aí que as cobras são surdas. Isso não é verdade. As cobras captam sons do ar, apenas numa frequência menor do que a da maioria dos animais. Também é mentira que a sucuri pode chegar a dez metros de comprimento. Quando atinge seis metros ela já é considerada rara.

O livro diz que o soro antiofídico produzido com auxílio de cavalos está obsoleto. Qual é a nova alternativa e desde quando está sendo produzida no Instituto Butantan?

A forma mais usual de produção de soro antiofídico é feita com o auxílio de cavalos, que recebem o veneno e produzem anticorpos. Isso é feito há mais de 100 anos. Esse soro, no entanto, embora seja eficiente para neutralizar a ação do veneno de cobras, traz consigo proteínas animais que podem causar algum tipo de reação alérgica no paciente. Com o avanço da biotecnologia já é possível produzirmos soro com anticorpo monoclonal humano, o que tornará obsoleto o soro que temos usado até então. O Instituto Butantan ainda faz uso do soro antiofídico tradicional, mas acredito que é questão de tempo para substituí-lo.

O Hospital do Instituto Butantan atende muitas pessoas vítimas de picadas de serpentes ou estes incidentes estão em queda com a crescente urbanização das cidades?

Não tenho esses dados estatísticos de cabeça, mas não diria que estão em queda. Ainda recebemos muitos acidentados, principalmente vindos da zona rural de São Paulo e das áreas periféricas. Apesar do crescimento urbano, ainda há bolsões onde o ser humano convive diariamente com a presença de cobras e outros animais peçonhentos.

Você diz, no livro, que a cobra-coral é a espécie nativa mais perigosa ao homem, mas que casos de óbitos motivados pela picada dessa serpente são raros. Por quê?

Por alguns fatores. Um deles é que, por conta de suas cores, a cobra-coral é muito fácil de ser identificada, o que a torna muito visível, ao contrário de outras cobras que se confundem com o mato ou com a terra. Outro fator – e talvez o principal – é que ela não é tão agressiva quanto a cascavel e a jararaca. Além disso, ela possui uma abertura bocal pequena, o que dificulta a sua mordida.

A pesquisa científica consegue responder se o medo que sentimos de cobra é inato ou adquirido?

Experimentos e estudos neurofisiológicos com macacos ajudaram a entender melhor essa questão. Verificou-se que existe uma área no cérebro de um determinado primata que reage de um modo específico, como em sinal de alerta, quando estimulada com a imagem de uma cobra. A conclusão é de que a resposta visual rápida é uma predisposição, até mesmo porque os primatas utilizados no teste nunca tinham visto uma cobra na vida. No Butantan nós temos um programa que se chama “Mão na Cobra”, que testa a reação das crianças ao entrarem em contato físico com as serpentes pela primeira vez, e todas demonstram fascínio ou medo, nunca indiferença. São milhões de anos convivendo com as cobras, então pode ser que tenhamos desenvolvido um sistema de defesa natural.

O livro dedica um capítulo à conservação das serpentes. Como a conservação dessas espécies se relaciona com a conservação do próprio meio ambiente?

A conservação das serpentes não é importante apenas para os fármacos, que ajudam a salvar vidas humanas, mas também para o meio ambiente, uma vez que elas fazem parte da cadeia alimentar. Porém, para além desses fatores, está o fato de que as cobras são bastante diferenciadas entre si e algumas são endêmicas de áreas restritas, como é o caso da Jararaca Bothrops Pirajai, por exemplo. Esse tipo de informação é de grande importância para estratégias de conservação, pois a presença desses animais ajuda a definir e limitar áreas preservadas, que não podem ser devastadas.

Como o Instituto Butantan tem atuado no sentido de garantir a conservação de algumas espécies de cobras?

Embora não seja uma atribuição dos pesquisadores, o Instituto Butantan iniciou o primeiro programa de conservação ex-situ da jararaca-ilhoa, uma espécie que vive exclusivamente na Ilha da Queimada Grande, que fica no Oceano Atlântico, no Estado de São Paulo. Estima-se que vivam por lá mais de 2 mil serpentes dessa espécie. Infelizmente essa população está ameaçada de extinção, por razões que expusemos no livro e que agorá estarão disponíveis ao público.

Serviço

O Quê: Lançamento do livro Nossas Incríveis Serpentes
Quando: Quinta-feira (21/02), às 19h.
Onde: Instituto Butantan (Av. Vital Brasil, 1500, Butantã, São Paulo).
Quanto: Entrada franca.

Compartilhar: