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O Parque Estadual Morro do Diabo (PEMD) é segmentado em um trecho de 14 km pela Rodovia Arlindo Bettio (SP-613), que faz a ligação entre os municípios de Teodoro Sampaio e Rosana. Embora tenha importância econômica e social por serem corredores de transporte, a estrada fragmenta a paisagem e causa distúrbios à fauna e flora. Neste contexto, há três décadas pesquisadores científicos do Instituto Florestal (IF) realizam o monitoramento do atropelamento de fauna e propõem medidas para a mitigação destes impactos na região.

O engenheiro florestal Helder Henrique de Faria realizou junto a guardas-parques neste trecho da rodovia, ao longo de dez anos (1989-1999), um monitoramento que contabilizou a morte por atropelamento de 182 indivíduos de 25 espécies de fauna. Destes, 29 (16%) eram de espécies ameaçadas de extinção.

Entre 2002 e 2010, foi realizado um monitoramento mais sistematizado, com o registro de boletins de ocorrência visando a obtenção de recursos de Compensação Ambiental. A partir da integração da bióloga Andréa Soares Pires ao projeto, em 2004, os dados passaram a ser inseridos em um sistema de informação geográfica. Neste período foram contabilizados 56 animais mortos, uma média de sete ao ano. Este levantamento permitiu definir pontos para a instalação de quatro conjuntos de radares fotográficos, bem com outras medidas visando a mitigação destes impactos, como a instalação de sinalização educativa e dois portais nas entradas do trecho que corta o Parque.

“Em função dos impactos da rodovia sobre a biodiversidade do PEMD registrados, o Conselho Consultivo da Unidade de Conservação (UC) e a comunidade foram decisivos na obtenção dos radares, dos alambrados para conduzir a fauna para as passagens subterrâneas e da manutenção em geral”, complementa Helder.

Um terceiro monitoramento, realizado entre 2015 e 2017, foi realizado como projeto de pesquisa, seguindo o rigor do método científico. “Mas se observarmos os dados de 2002 a 2010 e os deste último levantamento, mesmo o segundo período não tendo o mesmo protocolo, constatamos que os resultados são bem parecidos. O segundo monitoramento possibilitou inclusive que o trajeto se transformasse em estrada-parque”, relata Andréa.

O Decreto estadual nº53.146/2008 define os parâmetros para a implantação, gestão e operação de estradas no interior de Unidades de Conservação de Proteção Integral em São Paulo. Conforme artigo de autoria dos pesquisadores, é conhecido como “decreto estrada-parque”, muito embora não exista esta categoria de manejo no estado. O decreto prevê que o órgão, entidade ou empresa, pública ou privada, responsável diretamente pela implantação e operação da estrada pública inserida em UC, deve providenciar um Plano de Implantação e um Plano de Gestão e Operação para cada trecho de estrada. Os trechos de rodovias são transformados em locais especiais com instâncias de decisão diferenciadas. No caso do trecho de 14 km da Rodovia Arlindo Bettio (SP-613), por exemplo, há uma gestão conjunta entre o Departamento de Estradas e Rodagem (DER) e a Fundação Florestal, gestora do PEMD.

Em relação às passagens de animais silvestres, os pesquisadores observaram que poucas espécies utilizam de fato esses túneis para as travessias, principalmente animais de pequeno porte como ratos, cotias, tatus e lagartos. As passagens de fauna, mesmo com alambrados condutores, não se mostraram eficazes para a megafauna do Parque, que continua sendo atropelada. Cercar completamente a rodovia fragmentaria mais ainda a Unidade de Conservação e diminuiria o fluxo gênico das espécies.

Também foi observada a diminuição dos atropelamentos de animais nas proximidades dos quatro conjuntos de radares, mas a atitude dos usuários de acelerarem após passarem os dispositivos provocou algumas mortes nas imediações. Os radares fotográficos aparentemente diminuíram as velocidades médias dos veículos e possivelmente os atropelamentos, sendo eficazes para os locais onde estão instalados, no entanto produzindo uma alteração no padrão espacial dos atropelamentos.

Deste modo, os pesquisadores concluem que a melhor solução é a redução das velocidades em todo o trecho da rodovia, que é de apenas 14 km. “Para que isso aconteça devem ser utilizados a tecnologia dos “radares inteligentes” que conseguem extrair e transmitir dados da velocidade média de veículos entre dois pontos, efetuando o registro caso ele esteja acima da velocidade permitida”, defende Helder.

A taxa de mortalidade de mamíferos foi de 0,0113 indivíduo por quilômetro, que significa que a cada seis veículos que passem pela estrada, um animal pode ser atropelado, conforme explica Helder. “O índice encontrado é baixo, mas para uma Unidade de Conservação de Proteção Integral é inaceitável qualquer taxa acima de zero,” reforça o pesquisador.

A estimativa de atropelamentos foi de 52 espécimes ao ano, sendo 60% animais de pequeno porte. A riqueza de espécies segundo os três monitoramentos abarca 33 espécies. Os mamíferos mais afetados foram cachorros do mato, antas, tapitis, quatis e tatus. Merece destaque o ratão-do-banhado (Myocastor coypus), registrado no segundo período, e que agora foi comprovado seu estabelecimento no PEMD, já que não havia registros da espécie no Parque.

Entre os mamíferos ocorreu considerável perda de antas (Tapirus terrestris). Para valorar uma possível Compensação Ambiental, os pesquisadores produziram um cálculo para os seis indivíduos atropelados do último monitoramento. Os valores de recuperação das antas e de compensação foram de R$ 1.664.400,00 e R$42.608.640,00, respectivamente.

Os resultados do trabalho “Monitoramento e gestão dos impactos da rodovia SP-613 no Parque Estadual do Morro do Diabo, São Paulo, Brasil” serão apresentados no III Congresso Iberoamericano de Biodiversidade e Infraestrutura Viária (CIBIV 2020), que acontece de 7 a 11 de dezembro em ambiente virtual.

Fonte: Instituto Florestal

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