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Apesar de ser um dos países com a maior quantidade de água fluvial no mundo, o Brasil ainda consome pouco o pescado de água doce. Segundo o IBGE, o brasileiro consome 9,5 kg de peixe por ano (a média mundial é de mais de 20 kg por habitante) e apenas uma ínfima parte deste montante é de peixes oriundos de rios. Um dos motivos para o baixo consumo é o chamado “gosto de barro”, identificado por muitas pessoas, na carne destes pescados.

Visando evitar o off-flavor (sabor e odor desagradável da carne de peixe), que reduz pela metade o valor para venda, a Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (SAA), tem desenvolvido pesquisas para orientar aquicultores a manejarem de forma correta a sua produção.

Segundo Gianmarco Silva David, pesquisador da APTA, a causa do “gosto de barro” de alguns peixes decorre de substâncias denominadas geosmina e a metil-isoborneol (MIB), produzidos, principalmente, por cianobactérias e eventualmente estreptomicetos, organismos que vivem no próprio ambiente de cultivo do pescado. Ele explica que quanto mais suja a água, maior a tendência de ocorrer problemas com off-flavor. “Ao contrário do que muitos pensam, o aquicultor não cultiva peixe, mas sim água limpa. Apenas com a água limpa é possível produzir organismos aquáticos saudáveis e de qualidade, por isso, a importância da preservação ambiental”, diz.

Para não sujar a água é necessário dimensionar a capacidade do ambiente em suportar a produção do pescado. A eficiência é outro fator apontado pelo pesquisador. Para Gianmarco é necessário “avaliar a quantidade de ração adequada à produção, trabalhar com ração de alta qualidade e evitar que os animais fiquem estressados, prejudicando a boa conversão alimentar”.

Dentre as novas tecnologias e ações de transferência de conhecimento tocadas pela APTA, o pesquisador destaca o trabalho realizado em Ilha Solteira, principal região produtora de pescado do Estado de São Paulo. “Identificamos situações que podem acarretar perda da qualidade da água e damos suporte aos produtores para melhorar a qualidade da mesma e, assim, valorizar a sua produção”, explica.

A APTA, por meio do Polo Regional de Bauru e do Instituto de Pesca (IP-APTA), em conjunto com a Universidade Estadual Paulista (Unesp) e as universidade dinamarquesas University of Copenhagen e Aalborg University, desenvolveu projeto de pesquisa temático financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) para estudar o off-flavor. O projeto foi finalizado em 2018 e já originou várias publicações de artigos em revistas científicas internacionais como Aquaculture Environment Interactions e International Journal of Fisheries and Aquatic Studies.

Prejuízos estimados

O Anuário Peixe BR de 2019 mostra que a produção brasileira de pescado foi de 722 mil toneladas em 2018 e a paulista de 73 mil toneladas. De acordo com Gianmarco, as estimativas apontam que em cerca 10% da produção ocorram problemas relacionados ao off-flavor, o que geraria um prejuízo de, aproximadamente, R$ 13 milhões no Estado de São Paulo.

Este prejuízo, porém, é muito maior, segundo o pesquisador. “O principal problema é que a produção de peixe é estigmatizada. As pessoas costumam dizer que não gostam de peixe de água doce por conta do gosto de barro, que erroneamente consideram uma característica intrínseca dos peixes de rios e lagos. Isso prejudica toda a indústria do pescado, que tem trabalhado para mitigar o problema, evitando o processamento e venda de peixes com problemas de off-flavor. Esta é uma barreira para o crescimento do mercado nacional”, explica.

Laboratório de Qualidade da Água

O Instituto de Pesca mantém em São Paulo um dos únicos laboratórios do Brasil a concentrar análises físicas, químicas e biológicos da água para dar suporte à sustentabilidade ambiental das atividades relacionadas ao meio aquático. O Laboratório de Qualidade da Água do IP é qualificado a atender diferentes setores do agronegócio, em especial as atividades voltadas à pesca e à aquicultura, dependentes da qualidade dos recursos hídricos. “Este laboratório é muito importante para nossas pesquisas com off-flavor, com grande sinergia com as equipes da APTA que atuam no interior do Estado atendendo às demandas regionais da aquicultura. Água limpa é a principal questão para o produtor evitar o problema e disponibilizar à indústria e ao consumidor produtos de alta qualidade”, afirma Gianmarco.

Bruno Ribeiro, com informações da assessoria de imprensa da APTA.

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