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Fato conhecido na agropecuária brasileira é que o cerrado, com seus 204 milhões de hectares, será o Maracanã do setor, onde será jogada a partida final da Copa do Mundo da Alimentação que o Brasil conquistará quando chegar a hora.

Mas não foi sempre assim. Ao contrário. Até meados do século XX – ontem mesmo – o cerrado era considerado um território inadequado para atividades agropecuárias, por ser constituído por solos pobres em nutrientes e matéria orgânica importantes para as plantas e pastagens, ácidos, com pequena capacidade de retenção de água.

Mas a ciência e a tecnologia mudaram esse quadro. Estudos sobre o bioma realizados pelo Instituto Agronômico de Campinas começaram nos idos de 1958, na região de Batatais-SP, quando dois famosos engenheiros agrônomos – Walter Lazzarini e Coaracy Moraes Franco – montaram os seus testes sobre o café no cerrado, que continuaram até 1969. E o foco era a adubação do cafeeiro, dada a pobreza do solo. Na mesma ocasião, ocorreram experiencias com cerrados mais leves na região de Campinas. Esses trabalhos importantíssimos foram publicados em congressos Nacionais sobre Ciências do Solo, entre 1965 e 1975, sempre sob a responsabilidade daqueles dois técnicos e mais seu companheiro de trabalho Ferdinando Pupo de Moraes. Hoje o café é cultivado em cerrados com resultados espetaculares em São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo e na Bahia.

Por outro lado, foi publicado no IAC em 1981 uma circular relatando os resultados de experimentos de adubação em soja realizados entre 1973 e 1978 na região de Guaíra – SP, de cerrado também, pela equipe (da qual participou Joao Paulo Feijão Teixeira, atual presidente da Associação dos Pesquisadores Científicos de São Paulo) do prestigiado pesquisador Hipólito Mascarenhas. Esta é a publicação mais antiga encontrada no IAC sobre a leguminosa que mais tarde tomou conta do Brasil.

Portanto, estudos sobre o cerrado já eram conhecidos em São Paulo, quando foi instituído o Prodecer – Programa Desenvolvimento do Cerrado – lançado na década de 1970 pelo Ministério de Agricultura. Um programa notável que teve papel protagônico das nossas cooperativas agropecuárias.

E a partir daí a Embrapa assumiu com grande competência o trabalho de produzir com melhoramento genético, variedades que hoje cobrem mais de 36 milhões de hectares de soja por todo o Brasil. E vale lembrar que me 1965 só havia 400 mil hectares de soja, tudo no Rio Grande do Sul, produzindo 1.200 kg por hectare, menos de um terço do que se colhe hoje no país.

Segundo estimativas, em 2020 foram produzidos no cerrado 413 milhões de toneladas de cana, 52 milhões de toneladas de soja, 48 milhões de toneladas de milho, 4,32 milhões toneladas de algodão, 2,59 milhões de toneladas de mandioca, e mais de 3,35 milhões de toneladas de carne bovina. As áreas de cerrado ainda cobertas com vegetação nativa somam 112 milhões de hectares, com destaque para MT, TO, MG, MA, GO e BA, MS e PI.

Com mais ciência e inovação tecnológica, papel ainda mais notável na segurança alimentar global está reservado para o cerrado brasileiro, cuja experiência poderá ser replicada em todo o cinturão tropical do planeta, na América Latina, na África e também na Asia.

Roberto Rodrigues é Coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, Embaixador Especial da FAO para as Cooperativas e Titular da Cátedra de Agronegócios da USP.

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